Hoje escrevo à luz das baterias.
Não porque tenha faltado a luz, mas porque estou a executar o ciclo profilático de reciclagem da bateria do portátil.
E assim, sentado num confortável banco da cozinha, com o ruído da máquina de lavar roupa como som de fundo, vou ora teclando, ora vendo o último episódio do ER.
Já não tenho idade para isto. Estou a ficar velho. O pescoço estala por tudo quanto é sítio, fruto de pouco exercício e de maus hábitos de posicionamento à frente de computadores. Agora uma massagem vinha a calhar, mas já não estou com paciência para a fazer.
O banco começa a fazer-me doer o traseiro e, ao acabar esta frase, o ER já acabou, abandonei a cozinha e estou já no silêncio e escuridão da casa sentado na minha cama a ultimar o post de hoje.
Ando com os cornos em água. Penso que se agora partisse a cabeça, o mais provável seria ter uma massa aquosa, com a solidez perdida há muito, a escorrer-me pela brecha.
Também há muito tempo que não entrava novamente na onda das histórias deprimentes.
Bom, mas é verdade que há muito que larguei o vício do pobrezinho e que comecei a encarar a vidinha com outra vertente analítica.
Talvez seja esse o mal dos engenheiros. Tentamos analisar tudo e mais alguma coisa, procurando a coerência no que é naturalmente incoerente.
Errados ou não, acabamos mergulhados no nosso subconsciente, tentando alcançar alguma verdade absoluta no que não era suposto ser sequer relativo.
Confesso que ultimamente me começa a chatear ver pessoas a morrer.
Ou morrem rapidamente ou vão definhando lentamente.
E não sei o que me impressiona mais. Se a rapidez e precisa exactidão do ataque, se a incerteza do sei que poderá acontecer. Gostava sinceramente de saber o que poderei ter feito noutra vida para merecer esta mas, analisando criticamente o estado actual das coisas, talvez a perspectiva que tenho acerca da realidade tenha deixado de ser como duas rectas paralelas a cruzarem-se no infinito para, digamos, duas rectas sozinhas a formarem um parabolóide hiperbólico.
Amanhã sei que me espera mais um dia brutal. Entre os afazeres da manhã, da tarde e da noite, penso arranjar tempo para vir escrever mais um pouco.
Começo a tornar-me um viciado.
Há malta que fuma para acalmar, há pessoal que bebe para esquecer, há chouriços que se espetam para encontrarem um pseudo-delírio social. Eu, escrevo. Escrevo quando estou feliz, escrevo quando estou triste, escrevo quando estou calmo, quando estou nervoso; escrevo quando tenho algo para escrever e escrevo até quando não me apetece dizer nada; por vezes escrevo de mais, por vezes escrevo de menos.
O facto, é que fica sempre algo por dizer ou melhor, por escrever. E assim, resisto ao sono e assimilo as insónias para escrever. E escrevo para o boneco, e escrevo para a boneca enfim, escrevo para quem quiser ler.
Sim, é verdade, já me devia ter ido deitar. Mas resisto no meu posto, velando não sei bem o quê e pensando na vida enquanto escrevo. Penso no que fiz e no que vou fazer. Penso no que não fiz e no que deveria ter feito. E em todo este transe psicadélico oriundo das radiações que emanam do teclado, do router wi-fi e mesmo do ecrã, vou escrevendo como um doido.
Sejamos francos, escrever deveria ser a última coisa que eu hoje deveria estar a fazer.
E sinto que ganho oportunidades e perco outras.
A vida é um jogo de trocas onde, para conseguirmos determinadas coisas, abdicamos de outras.
Muitas vezes apostamos mal. Jogamos onde não devemos e arriscamos o que não devíamos. Não há ninguém para nos aconselhar. Aprendemos com os nossos erros. Mesmo que não os possamos corrigir, marcam-nos as estrias dos enrolamentos cerebrais (o que quer que isso seja).
Nada me tira da cabeça que vou perder um grupo de amigos.
Todos nós dizemos que não, os contactos permanecem. Mas a realidade é que, na maior parte dos casos, as vidas que se cruzaram parecem seguir outros rumos. E um ligeiro afastamento, implica uma distância que se propaga exponencialmente.
Espero estar enganado.
E um dia acordamos e estamos sós.
E escrevemos para que nos sintamos menos sós, eventualmente acompanhados por um qualquer ficheiro onde debitamos dados em catadupa.
A malta gosta do que escrevemos mas raramente percebe porque escrevemos.
Gostava realmente de deixar de escrever.
Tem dias.
Por ora, vou continuar.
Boas noites!
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