Acordo a meio da noite.
Tenho sede.
Apalpo as paredes ainda semi-obscurecidas pela habituação catastrófica dos meus pequenos olhos à luz do candeeiro ali da rua e, às cabeçadas, lá encontro a cozinha.
Tento não pisar a Cindy, a custo lá encontro o frigorífico e, maravilha das maravilhas, fez-se luz! A minúscula lâmpada amarela lá se acende, fruto de um interruptor de mola montado ao contrário, exactamente no momento em que a porta deixa de fazer pressão no sensor e o circuito volta a estar fechado, deixando passar a energia suficiente para se ver a garrafa de água no fundo da última prateleira.
Volto a fechar o frigorífico, tento não pisar a Cindy e, agora que tenho os olhos habituados à luz, a custo lá encontro o quarto e a cama, logo depois de mandar mais uma biqueirada na calha de chão por onde passam os cabos do computador.
E durmo mais umas horas.
*
Acordo a meio da noite.
Tenho sede. Mas não é aquela sede de quem quer beber alguma coisa para daí a umas horas estar a correr novamente para a sanita... é aquele apetecer de algo fresco e doce, pela garganta abaixo. Eventualmente, um geladinho cremoso... possivelmente de chocolate, com aqueles pedacinhos de chocolate. Ou então aquele de morango, com os pedacinhos (imagine-se) de chocolate... hum, parece-me óptimo.
Apalpo as paredes ainda semi-obscurecidas pela habituação catastrófica dos meus pequenos olhos à luz do candeeiro ali da rua e, às cabeçadas, lá encontro a cozinha.
Tento não pisar a Cindy, a custo lá encontro o frigorífico e abro o congelador.
O saco das ervilhas sai disparado porque tinha sido arrumado à pressão no compartimento compacto e voa directo aos cornos da Cindy, que se levanta em sobressalto e se atira às minhas pernas, arranhando-as como se não houvesse amanhã. Tropeço, e tento agarrar-me a alguma coisa. Dá asneira. Na pressa da queda, não encontro nada no escuro onde me possa segurar e dou um valente bate-cú no chão da cozinha, trazendo as batatas pré-fritas (e ultracongeladas) atrás. Como as leis da física são uma merda, com tanto movimento soltam-se também os cubos de gelo que caem sequencialmente em cima dos meus tomates (que entretanto já latejavam da queda). Ainda sem ver nada, levanto-me e dou uma valente marrada na porta do congelador. Ocorre-me colocar gelo, mas com as ervilhas e as batatas ainda no chão, e os cubos de gelo meio-derretidos nos calções, sobra o outro saquinho com o milho, que vou pressionando até conseguir encontrar o gelado.
Com mais meia-hora para limpar a cozinha, rendo-me finalmente ao interruptor da luz.
Volto a fechar o frigorífico, tento não pisar a Cindy, e agora que tenho os olhos habituados à luz, a custo lá encontro o quarto e a cama, logo depois de mandar mais uma biqueirada na calha de chão, por onde passam os cabos do computador.
Estou gelado. Perdi o sono. Não consegui saborear o gelado e agora com tanto movimento, o meu recto já só pede o aconchego, também gelado, da borda da sanita.
*
Isto tudo tem um sentido.
O sentido que há grandes cabrões que fazem frigoríficos, metem uma luz no dito cujo, mas não arranjam forma de iluminar o congelador.
E à conta dessas valentes bestas, estou na cama, de cú gelado e dorido, tomates molhados e um galo nos cornos.
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