03/09/2007

Mundo Perfeito

Os problemas começam todos quando somos crianças.
Pensamos que um dia queremos ser bombeiros, astronautas. Acreditamos no Pai Natal e na Fada dos Dentes. Julgamos que um dia poderemos ser felizes. Queremos mudar o mundo e, pior ainda, acreditamos que o podemos fazer. No mundo de fantasia, sem Morangos, Floribellas e afins, onde os habitantes são pequenos brinquedos que ganham vida, somos o Cavaleiro Branco, sem nome, que mata a bruxa má, enfrenta o Cavaleiro Negro, resgata a Princesa das garras do dragão e ainda consegue arranjar tempo para devolver o Reino a quem de direito.
À medida que crescemos, começamos a perceber que as coisas não são tão coloridas como tínhamos pensado. Afinal, o arco-íris ganha mais uma cor - o preto - e o nosso belo mundo acaba por começar a rachar os seus sólidos alicerces.
Logo na infância acordamos uma noite e vemos que quem nos trocava o dente pela moeda era a nossa mãe; e um dia, por puro acaso, abrimos o guarda-roupa e vemos um grande volume que, curiosamente, é igualzinho ao que acabamos por receber dias depois no Natal. E ainda conseguimos ser suficientemente ingénuos para pensar que o Pai Natal estava muito ocupado e que, por conseguinte, passou por nossa casa uns dias antes do Natal para deixar logo lá a prenda.
E achamos estranho, mas perfeitamente natural, que o senhor carteiro nos mande uma carta todos os anos com postais dos CTT para o próximo ano em resposta à carta que enviámos ao Pai Natal.
E um dia chegamos à conclusão que os bombeiros ganham mal e que precisamos realmente é de dinheiro. Queremos um dia casar, ter filhos, uma vida estável. E ser bombeiro já não nos serve.
E ser astronauta é algo que está ao alcance de poucos. E somos confrontados com o facto de termos óculos ou pequenos problemas cardíacos que nos vão impossibilitar até de sermos Pilotos Aviadores, quanto mais Astronautas...
E percebemos que a nossa vida está estruturada para sermos doutores, engenheiros ou zés-ninguém.
Olá Senhor Doutor, olá Senhor Engenheiro, vai mas é à merda Zé Couves.
E eu até tinha um Zé Couves. Lembro-me de um autocolante, num dos azulejos da minha cozinha, com um urso de jardineiras e chapéu de palha, ancinho numa das mãos e saco de couves no outro. Já não sei dele. O azulejo continua a ser o mesmo, na velha cozinha; o Zé Couves desapareceu há muito.
Concluímos um dia que não há Cavaleiros Brancos. Neste Mundo, é cada um por si. A Bruxa Má não morre, levamos uma coça do Cavaleiro Negro (que anda sempre acompanhado com amigos que dão a coça por ele... chamem-lhe parvo), a Princesa acaba é por ficar com o Cavaleiro Negro e, o Dragão... bem, esse, possivelmente ainda nos dá com uma patada que nos ficamos logo por ali. Senão, o Rei trata disso quando perceber que não lhe conseguimos reaver o reino.
E não há altruístas Cavaleiros da Dinamarca, não há Aragorns, Sam Wises ou Frodos, não conseguimos mudar o mundo e, mesmo que tentemos, ninguém aparecerá vindo da névoa, no topo da colina para nos ajudar. Seremos espancados, gozados e abandonados num fosso.
Há já algum tempo que não escrevia. Hoje, decidi optar por uma história tétrica e deprimente. É fixe, para começar o dia.
De qualquer forma, a infância é sempre algo de muito agradável.
A nossa feliz e muitas vezes inocente infância leva-nos a retardar por mais algum (pouco) tempo a dura realidade com que somos um dia confrontados.



Boa noite,

Cumprimentos Patinos

2 comentários:

Henrique disse...

Esqueceste as chiquititas...
É grave! :)

Pato Marques disse...

Nop... como me poderia eu esquecer dessa pérola televisiva? E aquela moçoila esquizofrénica que ora é, ora deixa de ser? A mesma que fica enfiada dentro daquelas roupas, mais parecendo uma alheira prestes a rebentar... dá sempre a sensação que vai saltar tudo cá para fora.

Repara, eu escrevi: "sem Morangos, Floribellas e afins"... as Chiquititas são os Afins.